terça-feira, dezembro 23, 2003

A Ajuda do Oriente


Todos nós evitamos gastar mais do que ganhamos. Este é, ou devia ser, um princípio básico na vida normal das pessoas, das empresas, das instituições e dos Países. Claro que existem sempre excepções, às vezes com toda a razão de ser, que dizem respeito a situações extraordinárias ou temporárias, a fases de maior dificuldade em que faz todo o sentido haver determinado nível de endividamento na expectativa de um regresso a breve prazo a uma condição mais normal e equilibrada.

Existem até casos exemplares, nomeadamente de grandes empresas, em que lucros de anos seguidos não chegaram para evitar a repentina ruptura financeira, exactamente por esquecimento de regras básicas elementares, como a de ajustar as necessidades de capital ao nível global da actividade, mas de forma sustentada, preservando o imprescindível equilíbrio.

Mas em relação a Países, a existência repetida de saldos negativos anuais nas contas comerciais e orçamentais, também pode revelar-se muito negativa e tornar complicada e demorada uma rectificação normal.

Hoje vamos passar por cima da situação orçamental portuguesa, cujo comentário ficará para outra altura, e analisarei alguns aspectos surpreendentes do actual défice da balança comercial dos Estados Unidos da América.

Em primeiro lugar, importa referir que o défice das contas externas dos EUA tem vindo a crescer de forma acelerada nos últimos anos, atingindo actualmente mais de 5% do PIB americano, e com tendência para continuar a crescer.

Neste contexto o dólar deverá continuar a cair, conforme está a acontecer serena mas firmemente desde princípios do ano passado. Se juntarmos a isso os juros baixos das obrigações do Estado, ficaríamos com a receita exacta para os EUA não conseguirem colocar no exterior a parcela da sua enorme dívida pública, tão necessária para cobrir o défice externo e, já agora, também o avultado défice orçamental. Pois é, quem quererá investir em dólares, com grande potencial de perda de valor e ainda por cima a juros modestos?

Embora exista cada vez menos interesse da parte de não residentes, a procura de activos em dólares por certos países continua muito forte e parece que, para já, essa situação se vai manter. E a razão é tanto mais simples quanto paradoxal. Expliquemos.

Do alto da sua posição de maior devedor mundial, os EUA irão continuar a ter quem lhes financie os seus fins de mês, porque o Japão, a China, a Coreia do Sul e Taiwan, entre outros, têm especial interesse nisso. Os americanos podem assim continuar descansadamente a consumir cada vez mais. É que todos aqueles países do Sudeste da Ásia arranjaram uma forma de se tornarem competitivos num mundo cada vez mais global. Habituaram-se a aplicar as receitas das suas exportações em activos de fraco rendimento denominados em dólares, nomeadamente títulos do tesouro americano, conseguindo manter as suas moedas adequadamente desvalorizadas e aumentar as suas exportações não só para os Estados Unidos mas também para o resto do mundo.

É um “negócio” em que todos parecem ficar satisfeitos, EUA e Países Asiáticos. Estes financiam sempre os EUA na parcela dos défices que for considerada necessária, e os Estados Unidos, por sua vez, continuam a adquirir um montante crescente das exportações daqueles.

O dólar a continuar a desvalorizar-se de forma ordeira e as taxas de juro a começarem eventualmente a subir num futuro relativamente próximo, são situações que não irão tirar um minuto de sono aos americanos. É que há a certeza que os mais de 2 biliões de dólares por dia, necessários para financiar o défice comercial, estarão completamente assegurados.

Só falta fazer uma pequena observação. Quanto maior for o desequilíbrio das contas públicas americanas maior a probabilidade de um ajustamento demasiado rápido ou mesmo brutal do dólar. Embora os EUA ainda sejam o centro financeiro mundial, os equilíbrios cambiais têm muito a ver com a confiança, e para além desta estar longe do seu ponto alto, será impossível manter durante muito mais tempo um dólar a desvalorizar continuamente com taxas de juro que não sobem. É assim que o caminho da retoma económica não será nem linear nem isento de profundos riscos.

Os sinais de alarme que continuam bem presentes podem repentinamente dar origem a modificações menos agradáveis na situação dos principais países, afectando o actual, mas instável, equilíbrio económico e financeiro internacional.

Há quem receie que a economia global seja uma espécie de castelo de cartas, em risco de desmoronamento. Mas nós vamos dar o benefício da dúvida, fazendo por acreditar que a tão ansiada recuperação económica veio para ficar.

sexta-feira, dezembro 12, 2003

Um Néctar dos Himalaias


A notícia do novo whisky indiano é deliciosa. Se calhar como a própria bebida que parece ter um leve sabor a maçãs e mel.

A empresa indiana, que mal tendo o produto testado se apressou a exportá-lo para a Escócia, deve ter contado com o tradicional fair play das ilhas britânicas, pois a primeira reacção dos consumidores escoceses foi até agora bastante positiva. Mas que dizer da suprema simpatia dos indianos, ao afirmarem ser injusto que a sua própria bebida (Amrut, que significa néctar) seja comparada à dos concorrentes escoceses. Explicam que é só “um malte indiano que tem carácter próprio”. Isto é verdadeiro marketing!

Os indianos mostram assim que são criativos, e mesmo quando são muito competitivos conseguem ser bem educados.

E, por este exemplo, estão prontos para uma batalha chamada desenvolvimento que deverá ser construído todos os dias, mas que já é muito visível, embora com data marcada no longo prazo.

Eles sabem que os países desenvolvidos só têm uma solução para continuarem a ser o que ainda são: ter trabalhadores do conhecimento com produtividade. E a Índia, com toda sua população imensa, que se vai tornar ainda maior no próximo futuro, tem imensas potencialidades, que estão a ser orientadas exactamente para essa área indispensável e decisiva, que permite aumentar radicalmente o padrão de vida.

Este é só mais um caso, extraordinariamente sintomático. Realmente, a destilaria do sul da Índia conseguiu produzir um whisky com um leve sabor doce, mas com um trago amargo que não é comum na Escócia, conforme foi dito, certamente com espanto, pelo especialista de Glasgow John Lamond e devidamente referenciado pela própria BBC!

Serão os escoceses capazes de responder com a mesma criatividade empresarial?

quarta-feira, dezembro 10, 2003

Um Passo de Gigante



Num dos últimos fins de semana, tive a satisfação de ler um artigo muito interessante de Pedro d´Anunciação. São textos destes que nos fazem acreditar que o País a que nos habituáramos, com uma falta de cultura congénita e dado a poucas leituras, terá certamente os dias contados.

Permito-me salientar uma frase, basta uma, tirada da sua crónica Zapping, no suplemento Actual do Expresso. A frase que eu prefiro sobre todas as demais é a seguinte: “Eu pensara já que um livro amado por tanta gente que não gosta de ler, não deveria fascinar os que amamos a literatura”.

É fantástico, com esta frase e de uma assentada, P. D´A. consegue dizer tudo. Senão vejamos.

Primeiro, existe muita gente em Portugal que está a amar um livro, sendo irrelevante qual ele seja, embora P.D´A. nos informe que é o “Equador” de Miguel Sousa Tavares. Mas torna-se bastante claro que P.D´A. só se estava a referir àquele livro como mero exemplo, havendo de certeza muitos outros livros também amados por muito gente. Esta, a primeira constatação muito interessante, a de que há um crescente gosto dos portugueses por livros, que não só lêem como até passaram a amar.

Em segundo lugar, toda essa gente que está a amar esse livro (e, como já concluímos, muitos outros livros), não gosta de ler. É triste, mas é verdade, segundo P. D´A. Todas essas centenas de milhares de leitores (nunca poderão ser menos, é fácil fazer as contas) afinal, não gostando de ler, fazem tanto esforço para devorar todos esses livros que até os conseguem, depois, amar. É simplesmente extraordinária a viragem que o nosso país está a fazer em termos de leitura de livros. Sim, porque ainda há os que amam a literatura, como veremos a seguir.

Realmente, e por último, diz P. D´A. que aquele livro (e como, já vimos, muitos outros) “não deveria fascinar os que amamos a literatura”. Ah! Estou a perceber. Os que amam a literatura, lêem mas não ficam de modo nenhum fascinados com “aquele” tipo de livros, e para além disso lêem necessariamente os livros que os fascinam! Lêem, portanto, tanto uns como outros, lendo desse modo ainda muito mais do que toda aquela outra gente a que P.D´A. se referia. Não sei se estão a ver, mas isto torna completamente desmesurado o número de portugueses que actualmente lêem livros!

O que é muito bom sinal! Só não sei se o próprio P.D´A. teve consciência do que conseguiu provar com o seu artigo. Ou teve?

segunda-feira, dezembro 01, 2003

Uma Aventura na América


1

O salão nobre da Universidade de Nova York estava repleto. Como em todas as grandes ocasiões, respirava-se a solenidade de uma atmosfera intemporal, cheia de tradições, de boas tradições, que certamente se haveriam de manter.

Estávamos em Maio de 1984, e ia ser concedido o Doutoramento Honoris Causa em Ciências Comerciais a Rose Gorelick Blumkin, de 90 anos. Sentada no seu alto cadeirão, Rose contemplava a assistência, o seu olhar deambulando devagar, primeiro por aquele espaço visitado por tantas gerações, depois pelo tempo, vagueou pelo seu tempo, pelo seu presente e, claro, pelo seu passado.

Principalmente pelo seu passado, a muitos milhares de quilómetros de si mesma, voltando atrás, muito atrás, à sua Rússia natal, onde afinal era bem ela própria que se via correr, naquelas manhãs tão frias, nos arredores de Minsk.

Quanto tempo passado, tanto tempo, mas lembrava-se bem da altura em que tinha resolvido partir, escapar da sua terra, e emigrar para a América com o marido. Fora há 67 anos, tinha ela então 23, e passava o ano de 1917.

Lembrou os primeiros anos nos Estados Unidos, de um trabalho duro e extenuante, vivido a dois, num autêntico contra-relógio para poder trazer a sua família para junto de si. E recordou também, com uma ternura imensa, a forma como aprendeu a língua inglesa, ela que nunca tinha entrado numa escola (nem o faria depois). Todas as noites, a sua filha mais velha ensinava-lhe, uma a uma, as palavras que tinha aprendido na escola durante o dia.

Estes pensamentos trouxeram-na momentaneamente ao presente, à Universidade e a esta cerimónia, o que lhe fez sentir um arrepio, ao pensar que era a altura dela, que a estariam já a chamar. Mas não, os discursos continuavam, e Rose voltou a admirar-se da forma como as pessoas estavam a ser simpáticas, como lhe estavam a dar uma atenção que ela não julgara possível, nem talvez merecida. Não, como poderia ser merecida uma honra destas se ela só tinha criado e dirigido uma empresa, com todo o empenho e honestidade é certo, até com bastante sucesso de que se orgulhava, mas nada mais? Era isso, a atitude da Universidade era extremamente simpática, mas ainda lhe custava imenso acreditar que o seu lugar poderia ser ao lado de tanta gente ilustre.

Mesmo sem querer, o seu cérebro voou de novo para os pensamentos de há pouco, que apareciam diante dos seus olhos com uma naturalidade e clareza que a ela própria admirava. Era curioso que não estava a passar em revista toda a sua vida mas sim determinados períodos e situações que se impunham com uma força determinante.

Veio-lhe à memória, o ano de 1937, em que depois de muitos anos a negociar roupas em segunda mão, tinha conseguido poupar 500 dólares e concretizar o sonho da sua vida: criar um armazém de venda de mobílias e tapeçarias, a sua Nebraska Furniture Mart. Que tempos! Lembrou-se bem de todos os obstáculos iniciais que teve de vencer, da concorrência feroz, da necessidade que teve de vender as mobílias da sua própria casa para pagar aos credores, exactamente na data combinada. Depois o negócio prosperou, ano após ano, até se tornar, de longe, a maior empresa de loja única do seu sector em todos o país.

Tinha tido razão, conseguira vender mais barato do que os outros e com melhor qualidade, dizendo sempre a verdade aos clientes. E nunca entrou em áreas onde não fosse a melhor, mantendo-se sempre no mobiliário e nas tapeçarias (estas últimas, eram mesmo a sua grande especialidade pessoal).

E, pensou, até a venda da empresa no ano anterior (por 55 milhões de dólares) tinha sido uma operação aconselhável e no interesse de toda a sua família. Para além do mais, todos se mantinham na gestão da “Mart”, e ela própria, com os seus 10%, continuou como Presidente da sua empresa.

E não evitou um sorriso ao lembrar-se da negociação com Warren Buffett. Ele fora de uma grande correcção, confiara nela em absoluto, dispensando até a auditoria e o inventário. E recordou-se da cara dele, um misto de compreensão risonha e de, ia jurar, admiração comovida, quando achou natural, e até necessário, que ela continuasse à frente da empresa.

A cerimónia continuava, ela ouvia o elogio do reitor, talvez mais pessoal do que ela esperaria. Mas Rose, estranhamente, não conseguia estar com a atenção que desejava, o seu cérebro parecia flutuar e demorou o resto daquele discurso a tentar serenar e a tomar consciência precisa do que se estava a passar. Até que o momento chegou e Rose estava doutorada. Exactamente na mesma Universidade em que tinham recebido idêntica distinção personalidades como os CEO´s da EXXON, Citicorp, IBM e General Motors e, pouco tempo antes, Paul Volcker, Presidente da Reserva Federal dos Estados Unidos, uma extraordinária figura de financeiro que influenciou decisivamente a economia americana nos anos 70 e 80.


2

E a sua vida continuou. O tempo foi passando, e Rose Blumkin (conhecida em todo o Nebraska por Mrs. B.), com a mesma alegria de sempre, mantinha o seu ritmo normal na empresa, trabalhando 7 dias por semana desde a abertura ao fecho, adorando atender os seus clientes, surpreendendo-os com excelentes negócios que eles se apressavam a aceitar. “Ia a casa para comer e dormir, e pouco mais. E mal podia esperar que o dia nascesse, para voltar de novo à empresa”. Parecia mesmo que ainda não tinha atingido completamente todo o seu verdadeiro potencial! E isto já com 96 anos!

O segredo do sucesso da sua empresa sempre tinha sido o nível extremamente baixo dos custos operacionais, que se situavam, de forma sustentada, em pouco mais de 15% das vendas. E foi assim que conseguiu apresentar um crescimento ininterrupto do volume de negócios durante 64 anos.

Mas em 1989, aconteceu uma situação inesperada. Devido a uma diferença de opinião com a restante administração da empresa (que incluía o seu filho Louie), Rose decidiu sair e criar, de imediato, num edifício adjacente que lhe pertencia, uma nova empresa de … tapeçarias, estabelecendo, alguns anos mais tarde, já com 99 anos, um acordo de não-concorrência com a “sua” Nebraska Furniture Mart!

Essa sua actuação não seria uma forma engenhosa de sair na altura certa, deixando todo o caminho aos mais novos (!), e para ao mesmo tempo continuar a fazer aquilo que sempre quis e soube?

Ao completar 100 anos de idade, as velas acenderam-se na empresa, para uma mais do que devida comemoração. Mas como o trabalho está sempre primeiro, Mrs. B. adiou a festa para uma tarde em que a loja estivesse encerrada…

Rose Blumkin, morreu em 1998, aos 104 anos de idade. A sua empresa mantém-se hoje na mesma rota de crescimento e de lucros, tendo atingido, no final desse ano, 300 milhões de dólares em vendas, as quais continuaram a subir com naturalidade até ao presente.

Tudo tinha começado em 1937, com um investimento de 500 dólares, um enorme entusiasmo, ideias muito claras do negócio e uma tremenda vontade de vencer.

Não há dúvida que ela foi e é uma fonte de inspiração, mesmo para quem nunca a conheceu!…

segunda-feira, novembro 24, 2003

Os BRIC´s não Brincam!

Se calhar não sabem o que são os BRIC´s? Quer dizer, saber sabem, mas aquela sigla é complicativa, até parece o nome de uma marca de cerveja. Os BRIC´s são, nada mais nada menos, os países que se posicionarão entre as 6 maiores economias mundiais, lá para meados deste Século XXI: Brasil, Rússia, Índia e China. Admirados? Não é caso para isso, vou já explicar tudo como deve ser.

Depois de muitas décadas de espera, tudo indica que estes quatro países irão entrar, à vez, a partir de 2040 - 2050, para o grupo dos países com maior poder económico do mundo, passando a integrar o G6, juntamente com os EUA e o Japão, ao mesmo tempo que desalojam os restantes. Embora continuem a ter, mesmo nessa altura, uma população comparativamente bastante menos rica do que estes, terão direito à honrosa etiqueta de grandes potências económicas, embora o título de superpotência se deva manter na posse dos Estados Unidos da América.

Mas, surpresa das surpresas, se os pressupostos não muito ousados de crescimento se concretizarem, a China ultrapassará o PIB dos EUA já em 2041, tornando-se a maior economia do mundo!

Claro que, por exemplo, também a Alemanha, a França e o Canadá falham completamente esta corrida, por não disporem dos factores decisivos para um crescimento real relevante: crescimento do emprego utilizando tecnologias avançadas, maior produtividade e progresso técnico e obtenção de elevados montantes de investimento directo estrangeiro.

Mas vamos lá fazer uma breve incursão no tempo até ao ano 2050 e já voltamos. Não é ficção científica, é tão-somente tentar antecipar a realidade, económica e sociológica. E, que diabo, também não falta assim tanto tempo como isso!

Preparem-se e façam por aguentar firme, pois as próximas cenas podem ser demasiado realistas e cruas para pessoas mais sensíveis. É o futuro em toda a sua plenitude que vai perpassar em frente dos nossos olhos, no ano 2050.

Vamos encontrar os EUA com uma grande maioria da sua população de origem não anglo-saxónica, onde avultará a comunidade de raiz hispânica, com grande taxa de natalidade. É verdadeiramente o que se pode chamar um outro Novo Mundo, em que os EUA irão perdendo posição relativa para os BRIC´s, sem contudo deixarem de ser a economia onde o rendimento per capita é o mais elevado e com uma subida sustentada ao longo dos anos.

Graças a taxas reais de crescimento médias superiores no longo prazo (entre 5% e 7%), a China e a Índia poderão ultrapassar, respectivamente, o PIB dos EUA (em 2041) e o do Japão (2032). É de notar que se prevê que os EUA cresçam a uma taxa real média de 2% ao ano até 2050.

Especialmente por motivos de diferença sensível nas taxas de natalidade, a actual União Europeia deixará de ter mais 90 milhões de habitantes do que os EUA, como agora acontece, para passar a ter menos 50 milhões, em 2050. Uma nota para referir que a imigração não permitirá solucionar problemas da Europa em termos de escassez de mão-de-obra e desenvolvimento, atendendo a que os imigrantes tendem a ter poucos filhos no seu novo país, especialmente na 1ª. geração.

Neste quadro, a União Europeia como um todo, supondo que se mantém a sua unidade política, fica com uma dimensão económica muito inferior, representando em 2050, somente 27% da China, 33% dos EUA e 40% da Índia. De qualquer modo, considerada como se fosse um País, seria à vontade a 4ª. economia do mundo, a seguir a estes três países.
Um aspecto que necessita ser realçado é o facto de as maiores economias do mundo (pelo PIB) deixarem de ser, na maioria dos casos, as mais ricas (pelo rendimento per capita).
O estudo recente da Goldman Sachs, em que me estou principalmente a basear, é tecnicamente bastante credível. No entanto, existem determinados pressupostos chave cuja alteração poderá implicar uma modificação substancial no quadro de situação para as próximas décadas.

Mas se os pressupostos se materializarem teremos a seguinte ordenação dos principais países, em termos de PIB e de Rendimento per capita, em 2050:

PIB (em biliões de USD) PIB per Capita (em USD)

1 – China 44.453 1 – E.U.A. 83.710
2 – E.U.A. 35.165 2 - Japão 66.805
3 - Índia 27.803 3 – Grã-Bretanha 59.122
4 – Japão 6.673 4 – França 51.594
5 – Brasil 6.074 5 – Rússia 49.646
6 – Rússia 5.870 6 – Alemanha 48.952
7 – Grã-Bretanha 3.782 7 – Itália 40.901
8 – Alemanha 3.603 8 – China 31.357


E, perguntarão, qual o papel de Portugal no meio desta dinâmica toda? Ora essa, nós pertencemos à União Europeia, as coisas têm que ser vistas no conjunto desta, como um todo. Ah! Não pode ser?! Não é cientificamente correcto porque somos um país soberano? Pronto, está bem, então vamos lá analisar isso rapidamente.

Pelas minhas contas, no ano 2050, a União Europeia já deve contar, pelo menos, com 33 países. Isto, depois da entrada dos novos 10 membros em Maio de 2004, da Roménia e Bulgária em 2007, logo a seguir da Croácia e, alguns anos depois, do conjunto formado pela Turquia, Sérvia-Montenegro, Bósnia-Herzegovina, Macedónia e Albânia. Embora discutível, deixo de fora a Suíça, Noruega e Islândia, pelo desinteresse até agora manifestado, e a Ucrânia, Bielorrússia e Moldova, por falta de contactos nesse sentido e pela complexidade das eventuais negociações, que teriam de envolver a Rússia.

Está-se mesmo a ver que o objectivo de Portugal será sempre qualquer coisa do estilo, apanhar o pelotão da frente (nessa altura mais alargado) ou sermos um dos melhores dos pequenos países do sul da Europa.

Claro que se alguém quiser fazer aos países da UE alargada, um estudo semelhante ao dos BRIC´s, dá-me a impressão que as surpresas também serão muitas e talvez não muito agradáveis para nós.

sábado, novembro 15, 2003

A Teoria dos Três R´s

A Teoria dos Três R´s

Será agora que a nossa EDP arranca? O Euro não consegue por agora subir mais um pouco e vai fazer uma correcção para ganhar forças? A situação político-económica japonesa impõe neste momento um acompanhamento mais apertado? E, muito importante, o ouro vai mesmo passar os 400 dólares como se fosse uma flecha?…

Estas e outras questões necessitam de resposta, acompanhamento e acção.

Mas a vida é só isto? Claro que era bom que pudéssemos viver dos ganhos nos mercados financeiros, mas mesmo assim, há mais coisas, existem outros interesses, é imprescindível alargar os horizontes!

Vamos mesmo abrir um parêntesis na nossa vida semanal e fazer uma pequena sessão de relax, aplicando o sistema dos 3 R´s do trader de sucesso (Rest, Relaxation, Research).

Então vamos falar de viagens? Bolas, isso é um bocado banal. Não, eu gosto mesmo é de as fazer, vamos escolher outro tema!

Discutir a nossa situação política e a contribuição do nosso país no esforço para estreitar os laços … bla bla bla bla bla bla … Bem, isso não vai descontrair nada, até porque há alguns dramas em curso. O melhor é ficar para uma outra vez.

Ahh! Já sei, desporto… talvez futebol, estão interessados em futebol? Não? Porque é outra vez uma misturada de política e … pois, é melhor não. Se calhar podíamos falar das outras modalidades desportivas, agora que começam a estar próximos os Jogos Olímpicos. Mas, talvez, não mencionando aquele novo produto que afinal era tão dopping ou mais que os outros todos. Mas assim não fica quase nada para falar, não é? Também me parece!

Estou a ver, não têm coragem de confessar, mas o que gostavam mesmo era de uma boa dica, de uma opinião certeira, de dados que justificassem aquela subida desafiadora ou aquela descida quase infame, com bases técnicas e fundamentais tão promissoras.

Mas não, não me convencem, agora vamos mesmo fazer um intervalo. E como não há alternativa, vou mesmo falar de um das raras coisas que neste ano da graça de 2003, me interessou e entusiasmou. Estou a referir-me ao livro “Equador” de Miguel Sousa Tavares.

Fiz a leitura deste livro, com mais de 500 páginas, de uma forma mais do que interessada, avassaladora, quase obsessiva, não descansando enquanto não o terminei. Eu sou um crónico leitor de inícios de livros - que são depois postos de lado, de livros corajosamente levados até metade – que depois ficam para acabar mais tarde, de livros policiais desprezados – excepto de dois ou três autores, de livros escolhidos até à exaustão – sempre com um critério muito apertado. É por isso que ter gostado tanto do “Equador” é um caso fora do comum, que só me acontecia quando lia, em criança, Emilio Salgari, e depois, já quase adulto, Eça de Queiroz.

Para mim o livro é extraordinariamente interessante a vários níveis.

Primeiro, porque a sua escrita é sempre inteligente, criando um ambiente de realismo quase palpável. E isso ligado a um estilo fluente e sólido, com desenvolvimentos inesperados, que faz com que acompanhemos a acção com interesse crescente.

Para além disso, o tema, que partiu de uma situação verídica, é de uma densidade assombrosa, com uma história tão humana quanto heróica, e que merece ter sido romanceada a tão alto nível.

Sousa Tavares, anda talvez a perder-se na sua função qualificada mas menos importante de comentador. Ele, que discorre e emite opiniões sobre os mais variados casos e assuntos do nosso país, numa tarefa árdua e que provoca muitos ódios de estimação, não pode dessa maneira ficar com o tempo e a paz de espírito suficientes para ser o romancista que ele pode ser.

Mas voltando ao livro, um dos seus aspectos centrais vai buscar muito à condição de ser português, daquele que tenta cumprir os ditames da honra como primeiro objectivo. Mas na vida, não basta pensar que se tem razão, é preciso algo mais, ver mais longe. É necessário ter uma percepção muito clara sobre a viabilidade da reacção dos outros: será que eles poderão, quererão ou estarão dispostos a ser convencidos da nossa razão?

No plano estritamente individual, se em consciência pudermos antever que as nossas certezas não têm condições de vingar, só há uma saída: seguir outro caminho e não ter que dar contas a ninguém.

sábado, novembro 08, 2003

O Exemplo da Srª. Blumkin

Não foi propriamente uma paixão louca, guiada pelo coração e alheia a tudo o resto. Muito menos se tratou de um amor à primeira vista. Mas poderá sem dúvida afirmar-se que, como muitas vezes acontece, foi o homem que tomou a iniciativa, que pacientemente a seguiu e, por fim, a convenceu. Esta é também uma ligação que triunfou, apesar de alguma oposição da família dela.

Aconteceu em 1983, no Nebraska, a Srª. Rose Blumkin tinha 90 anos e Warren Buffett estava a caminho de se tornar um dos homens mais ricos da América.

Quando, depois de longo estudo e acompanhamento, Buffett comprou a sua empresa de mobílias, a mais competitiva e rentável dos E.U.A. no seu ramo, a Srª. Blumkin, ainda detentora de 10% do capital, continuou muito naturalmente a trabalhar na empresa, no seu lugar de Presidente do Conselho de Administração, e disposta a imprimir-lhe a sua costumada e extraordinária dinâmica.

Como grande investidor de longo prazo, Warren Buffett detém inúmeras empresas muito lucrativas e de elevado crescimento. Actualmente, com duas dezenas de biliões de dólares em dinheiro para aplicar, ele não consegue encontrar activos que o possam realmente entusiasmar. Isso não é mais do que o reflexo de uma economia mundial ainda com muitas interrogações. Por um lado a falta de motivação, por outro o facto de o seu império empresarial quase andar por si próprio, faz quase ter pena do nosso amigo, sem ocupações suficientes para passar o tempo…

É exactamente esta a altura que Portugal deveria escolher para preparar o envio de uma delegação, com todos os poderes, para cativar este multibilionário, momentaneamente desincentivado, levando-o a interessar-se pelo problema económico-financeiro português, de forma a poder orientar-nos e criar uma estratégia para a nossa recuperação, que de outro modo se afigura muito problemática.

Na prática, o objectivo seria convencê-lo a tornar-se o consultor financeiro da República Portuguesa. Se ele alguma vez aceitasse, o seu preço nunca seria demasiado caro, disso poderíamos ter a certeza. Por outro lado, não estaria em causa o nosso interesse no dinheiro dele para investir em Portugal. Não, o que nós precisamos é que ele, com a sua capacidade de intervenção a nível mundial, nos proporcione a entrada de novos investimentos estrangeiros a sério, quer em montante quer em importância de projectos, para o desenvolvimento acelerado do nosso País. A brincar, a brincar, depois de tudo o que Buffett já fez na vida, se calhar esta tarefa até seria interessante – endireitar um País que precisa de um milagre para crescer (estou de acordo com Silva Lopes, só que milagres não há!).

Era como se ficássemos com uma Agência Portuguesa para o Investimento nº.2, a juntar à que já existe no Porto, sendo esta outra informal, em Omaha, Nebraska, com um objectivo reforçado de captar negócios internacionais para o nosso país, pondo multinacionais a investir, grandes projectos a arrancar, massa cinzenta a ser aproveitada, o Governo a deixar de complicar, o Belmiro a aplaudir, … Uff!! A perspectiva não era má!

Então, um dia destes, poderíamos começar a esboçar um sorriso, ou mesmo, que diabo, um riso sereno para desenferrujar os músculos da cara, espantando esta tristeza e melancolia que quase nos abate.

Não me digam que não tinha piada, com mais ou menos hipérboles, arranjando a dose certa de realismo, não acham que isto tem mesmo de ser feito? É que, um ano destes, seremos muito provavelmente o 25º e último país da União Europeia e vamos continuar a ouvir uma história de um qualquer chefe político, de serviço na altura, a afiançar que lá para o ano 2043, estaremos de certeza perto da média da União (média essa que, entretanto, terá descido bastante com a entrada dos 10 novos países).

Não queremos isso, pois não? Eu, pelo contrário, já me vejo nesse outro futuro, onde ganharemos nova alma e uma personalidade revigorada, e onde, de tão lançados que estaremos, deixarão de ter importância muitas partes gagas da nossa classe política.

Num panorama desses, já ninguém se importaria que viesse para Presidente da nossa República, aquele senhor engenheiro que esteve a tentar ajudar o Lula a fazer política social no Brasil. E nós ralados!...


Um abraço e …

Espero as vossas empenhadas ideias para pôr de pé este sublime desígnio de convencer o Buffett (o engenheiro não é preciso convencer!). Tudo sob o lema que resumiria o nosso novo modo de ser: “Cuidado, vamos ser um País de sucesso!”

Comentador


Nota

Fica desde já prometido que um dia contarei, em traços gerais, a história da vida de Rose Blumkin. Posso adiantar que é uma vida extraordinária, vivida com determinação, verdade, profissionalismo e muito trabalho. Umas vezes comovente, outras vezes inacreditável, a sua vida pode considerar-se única e é com inveja que digo que ela esteve sempre, mas sempre, muito acima de pessoas normais como nós.

terça-feira, novembro 04, 2003

Warren Buffett e Nós

Warren Buffett é o segundo americano mais rico, logo a seguir a Bill Gates. A sua fortuna foi conseguida ao longo do tempo, numa sucessão de êxitos financeiros muito consistentes e de grande amplitude, intercalada com raros insucessos.

Muitos associam-no aos grandes especuladores dos mercados, à semelhança de um George Soros, por exemplo. Nada mais errado! Warren Buffett é um investidor de muito longo prazo, que compra grandes lotes de acções, ou de outros activos, com o objectivo de os deter por um período de tempo indeterminado, se possível para o resto da vida, desde que mantenham uma rentabilidade adequada.

Ele tem deixado de ganhar muito dinheiro ao não investir próximo do pico das subidas mais exuberantes. Isso aconteceu em 1998/1999 e está de novo a ocorrer nesta altura, em que tem várias dezenas de biliões de dólares em cash sem nenhum entusiasmo para os aplicar.

Um dos seus princípios básicos é “tentar ser receoso quando outros são gananciosos, e ganancioso só quando os outros têm receio”. Parece fácil, mas é extremamente difícil.

É importante referir que, desde 1970, todos os seus investimentos são efectuados através da sua holding Berkshire Hathaway, baseando a sua estratégia em investir em empresas sólidas e com boa taxa de crescimento em cuja actividade acredita após um estudo exaustivo. Atendendo ao enorme valor dos activos de que dispõe, a geração de cash flow da holding de que é o principal accionista, tem uma dimensão exorbitante.

Transaccionar activos cujo conhecimento dominamos, após estudo profundo, não seguindo os exageros da multidão!... Estes princípios, salvaguardadas as devidas proporções, podem e devem ser aplicados aos investimentos de qualquer um de nós.

Claro que Warren Buffett também efectua operações especulativas de curto prazo, nos mais diversos activos, as quais no entanto constituem uma ínfima percentagem da sua carteira de aplicações.

Independentemente do prazo normal de trading/investimento de cada um de nós, é bom não esquecer ainda um outro dos seus princípios, este especialmente dirigido às acções: “se não estiver disposto a conservar uma acção por 10 anos, não pense sequer em tê-la por 10 minutos”.

Portanto, onde julgávamos ver um especulador feroz, de curto prazo, atento a toda e qualquer oportunidade, manipulador de empresas, vamos antes encontrar um verdadeiro investidor de enorme dimensão, bastante cauteloso, comprador de participações em multinacionais ou da totalidade do capital de outras empresas de grande rentabilidade, com o objectivo de as manter e desenvolver.

Muitas vezes cometemos um dos erros mais graves que um investidor/especulador normal deverá tentar evitar (excluindo o daytyrading, que é um caso especial). É o de andarmos atrás de variações de muito curto prazo, transaccionando com perdas repetidas, ou não deixando correr os lucros, quando deveremos “ignorar flutuações a curto prazo, excepto se elas invalidarem as expectativas de médio/longo prazo”.

Este é um erro que Warren Buffett nunca comete. Claro que com o dinheiro que ele tem, poderia ter uns devaneios e entrar mais na zona de risco. Mas o negócio dele não é perder dinheiro! Nós, com o dinheiro que temos, é que não podemos mesmo facilitar e fazer experiências, só para ver se dá. Mas para que o risco não venha ter connosco quando não é convidado, precisaremos de fazer uma boa preparação e de investigar e estudar devidamente todos os activos que negociamos.

domingo, outubro 26, 2003

A Quimera do Turismo

Estar de férias na Jamaica!

Este é mesmo o sonho de muita gente, a esperança de visita a uma ilha de praias belas e tempo maravilhoso, de resorts de luxo e floresta tropical de muitos tons.

Um destino de revista, uma terra quente e hospitaleira, sob o som de música alegre e ritmo forte, ela é também uma fotografia viva com as cores da felicidade.

Ouvindo o gelo a vogar no copo longo de rum com cola, embalo-me no doce sussurro deste mar de cor impossível, no intenso prazer deste sol e desta brisa doce que me abriga.

Esta Jamaica, que vejo sob os olhos fascinados de turista, parece um lugar onde gostaria de ficar para sempre, numa vida distendida e calma, com um trabalho livre e ocasional, quando houvesse vontade.

Mas façamos um esforço de análise, abandonando as águas cálidas de Montego Bay. A Jamaica é um país que vive principalmente do turismo, embora tenha também boas produções de bauxite, alumínio e cana-de-açúcar. Estas fontes de rendimento são indispensáveis para a economia da ilha, que tem um défice comercial crescente, e que importa a maior parte das suas necessidades de consumo e de equipamento.

Trabalha, directa ou indirectamente no turismo, uma grande parte da população activa do país. Mesmo com bastantes unidades de luxo, constata-se facilmente que a esmagadora maioria dos trabalhadores do sector turístico efectua funções muito pouco qualificadas ou de reduzido valor acrescentado. Para além da extracção mineira e de um sector agrícola reduzido, os restantes sectores industriais e de serviços têm uma importância secundária.

Com este pequeno retrato, a que se junta uma taxa de desemprego a rondar os 15%, não é difícil aceitar que a Jamaica esteja bem dentro do terceiro mundo, apresentando um PIB per capita de cerca de 3.900 dólares anuais.

Se prestarmos atenção às condições da vida corrente, veremos que as estradas são más, há muitas falhas de electricidade e o sistema de saúde é insuficiente. Pior do que tudo, parece haver uma atitude passiva e de aversão à mudança.

Estamos assim perante um país que, tendo grandes potencialidades turísticas e vivendo há décadas praticamente dependente do desenvolvimento desse sector económico, só conseguiu atingir um nível de desenvolvimento que teremos de considerar muito modesto. Com efeito, com uma população de 2,9 milhões de pessoas, o seu PIB per capita, acima referido, é bastante baixo, mesmo quando comparado com outros pequenos países da América do Sul e Central, como por exemplo a Costa Rica (8.500 dólares de rendimento per capita) e o Uruguai (7.800 dólares).

Se alongarmos a nossa vista pelo mundo e reflectirmos um pouco, poderemos chegar a algumas conclusões simples, que nos permitirão começar a ponderar, com outros olhos, a estratégia de desenvolvimento a definir para Portugal, mais realistas e evitando análises abstractas que nos farão tropeçar como país por mais algumas dolorosas décadas. Por exemplo, não existe nenhum país, em todo o planeta, que se tenha desenvolvido a sério pela acção determinante do turismo. Por outro lado, poderemos também dizer que o turismo não é nunca um sector realmente decisivo em nenhum dos cerca de 40 países mais desenvolvidos.

E percebe-se porquê. Muitos dos projectos turísticos têm, por vezes, alguma dificuldade em conseguir um razoável retorno dos investimentos efectuados. Só uma pequena franja tem real capacidade de ter um efeito gerador de elevados rendimentos. Os grandes casinos, que pertencem a este último grupo e são até os que maiores rendimentos proporcionam, têm apesar disso um potencial de desenvolvimento limitado. E o nosso País até já está bem colocado nessa área, pelo que os outros 2 ou 3 novos casinos já planeados certamente esgotarão (ou ultrapassarão) as possibilidades da procura respectiva.

Está fora de causa negar a importância do turismo em Portugal, o qual deverá ser incrementado com investimentos cada vez de maior qualidade. O que tem de ser contestado frontalmente é a ideia que, no futuro, o turismo irá desempenhar o papel de motor do desenvolvimento económico português.

Uma discussão sobre este tema será fundamental para o nosso país, dado que está a ser falada, a vários níveis, a escolha do turismo como objectivo principal da nossa estratégia de desenvolvimento.


terça-feira, outubro 21, 2003

A Jamaica da Europa?

Vagamente sonolento, olhando o horizonte sob o telheiro de casa, o meu pensamento deambula por diversas situações desconexas, contraditórias e absurdas. Neste domingo chuvoso, fica paradoxalmente mais claro, que o nosso País está cada dia que passa mais bizarro, menos pujante, numa defensiva triste, economicamente em baixo, embora sabendo que tem potencialidades para mais, mas que não as desenvolve.

A nossa vida pessoal e colectiva deve ser positiva e afirmativa. O tempo urge e Portugal precisa realmente de se encontrar e fazer pela vida.

Picasso dizia que não sabia o que era o génio nem quando ele se manifestava. Tinha era a certeza que, se o tal génio aparecesse, o apanharia sempre a trabalhar. Talvez seja o que nos falta, não o génio, mas trabalhar com determinação e com verdadeiros objectivos, porque assim talvez o tal… digamos talento apareça. Ou, simplesmente, a nossa capacidade se manifeste.

Enquanto, junto a mim, os meus dois cães roem deleitados os seus ossos, dei comigo a pensar que é importante desligar do ambiente negativo que nos rodeia a todos e trilhar com pé firme o caminho que achamos mais promissor. Por mim, já decidi: vou dar o meu melhor naquilo que gosto e sei fazer e vou recusar o espírito de inferioridade, de divergência que o nosso País assume, por exemplo, em relação a toda a Europa comunitária. Não, eu não quero esperar por 2006 para começar talvez a convergir!

Claro que, com os empresários que temos, ainda por cima mal habituados pelo Estado, não é fácil apostar numa direcção segura de melhoria de competência e inovação empresarial. Ganhar uns milhões aqui e investir outros milhões ali, não chega. É necessária uma verdadeira capacidade de intervenção em sectores e indústrias que realmente aumentem o nosso produto e melhorem os nossos rendimentos. Manter, ao arrepio das forças de mercado, os principais centros de decisão empresarial em mãos portuguesas é, portanto, não só uma impossibilidade mas também uma insensatez.

O que o País precisa é de captar investimento estrangeiro a sério, de elevada tecnicidade, com grande valor acrescentado e em sectores que permitam evolução tecnológica e crescimento. Penso que não interessa muito ter inúmeros processos de investimento estrangeiro em análise burocrática, precisamos é de 3 ou 4 projectos de elevada dimensão e tecnicidade, o que deveria constituir um verdadeiro objectivo nacional.

E os sectores que têm futuro e em que já somos bons, devem também ser desenvolvidos, sem deixar de acautelar devidamente as particularidades regionais.

Quanto ao Turismo, essa nova quimera portuguesa, tão em moda e tão em voga, para que não se torne o desencanto das próximas décadas, não vamos pensar que será a galinha dos ovos de ouro. Porque não vai ser. Claro que é um sector muito importante, a vários níveis, que espero que cresça todos os anos. Mas nunca pode ser a base da nossa economia. Não me digam que queremos ser a Jamaica da Europa!?

domingo, outubro 19, 2003

Vem aí a Retoma?

Relativamente aos “leading indicators” (sem esquecer os “misleading indicators”…), temos de estar sempre alerta pois, embora uns tenham mais importância do que outros, são muitas vezes os menos considerados que conseguem dar preciosas indicações sobre a situação económica global.

Penso que esta é a altura certa de abordar o cobre, o qual está nesta altura numa espiral de subida fortíssima que pode confirmar o prelúdio de uma efectiva recuperação da economia mundial. Realmente, o cobre é um dos primeiros elos da cadeia industrial e o aumento do seu consumo é muito relevante.

No entanto, não há uma completa relação de causa-efeito, constitui mais um sinal avançado, não sendo de espantar que a retoma da economia se continue a sentir cada vez mais, enquanto as cotações do cobre podem começar a corrigir. Digamos que o cobre deu o aviso, mesmo que a sua cotação possa de novo ter uma grande volatilidade, sem prejuízo de, no médio prazo, haver campo para mais subidas. Por outro lado, não nos esqueçamos que a cotação do cobre é expressa em USD, e se for convertida em euros o seu preço ainda não atingiu os valores do princípio do ano passado.

Uma próxima correcção poderá assim acontecer porque, numa situação como a actual, tem sempre muita influência nos preços a eventual reabertura de algumas minas anteriormente encerradas ou com actividade reduzida. De igual modo, há uma grande tendência para serem efectuadas compras especulativas, fazendo aumentar a cotação para além do razoável. Isto sem prejuízo de se considerar efectivamente sustentado o aumento de consumo dos principais compradores mundiais (com a China à cabeça).

Aliás, esta minha crónica sobre a ligação do cobre à retoma económica, não pretende analisar as condições de trading deste metal, que é altamente desaconselhável e perigoso para pequenos e médios investidores mais ou menos amadores, como todos nós somos.

Mas reforço a ideia de acompanharem a evolução das cotações do cobre, atendendo à sua característica de auxiliar a análise sobre a evolução da conjuntura económica internacional.

Para uma adequada perspectiva, a seguir indico os dados actuais mais salientes:

a) O máximo atingido esta semana – 90.20 cts/lb, constitui também o máximo dos últimos 3 anos.
b) Nos últimos 6 meses, a cotação do cobre subiu 27%.
c) O preço mínimo dos últimos 10 anos - 60.50 cts/lb, foi estabelecido no início de Novembro de 2001. A partir daí, pode dizer-se que o cobre está em tendência ascendente de médio prazo, acentuada a partir de Outubro de 2002.

Uma nota final sobre a retoma económica global. Parece não haver dúvidas de que ela está já em curso. No entanto, é fundamental acompanhar outros indicadores que traduzam a “qualidade” desta retoma. Com efeito, a carga desta recuperação ainda está grandemente baseada no aumento do consumo por via de obtenção de crédito, sendo a taxa de poupança baixíssima em praticamente todos os países, excepto na Ásia. Um maior equilíbrio neste capítulo será indispensável a médio prazo.

quinta-feira, outubro 16, 2003

A Nossa “Street”

Actualmente temos a sorte, a que já não atribuímos o devido valor, de poder concretizar operações de bolsa em poucos segundos, mesmo estando em Lisboa a transaccionar noutras praças, a milhares de quilómetros de distância. De acordo com o conhecimento, necessidade e capacidade financeira de cada um, são muitos os activos que se podem movimentar através do nosso computador pessoal. Neste nosso tempo, tudo isso passou a ser uma quase necessidade básica, a que a tecnologia dá satisfação num ápice.

Ainda que eu seja um investidor calmo, com as posições cobertas de diversas formas, não necessitando de um acompanhamento permanente, não dispenso assistir durante alguns minutos do dia, à evolução do mercado on-line, acompanhado de informações e notícias actualizadas. Sendo um trader de fim do dia, isso permite-me fazer a minha vida “normal”, estabelecendo a estratégia mais conveniente para o dia seguinte.

Mas as coisas nem sempre foram assim! A modernização dos mercados acompanhou naturalmente a enorme evolução que existiu nos últimos séculos em todos os domínios. É, pois, muito interessante ter um conhecimento, ainda que muito superficial, do que se passou em Portugal nos primórdios da Bolsa.

Ontem, estive a folhear uma obra bastante interessante sobre as origens da nossa bolsa. Fiquei a saber que, pelo menos a partir do século XIV, a Rua Nova, “a mais extensa e larga de todas as artérias de Lisboa” (mais ou menos onde é agora a Rua do Comércio), foi efectivamente o centro de negócios de Lisboa, sendo passagem obrigatória de todos os estrangeiros que nos visitavam, especialmente em negócios. Pode dizer-se que, a partir do início do século XVI, se encontram ali as origens da Bolsa de Lisboa, com um local próprio para os corretores e um espaço delimitado para a transacção de todas as operações financeiras da altura, que envolviam grande movimento de compradores e vendedores.

Mais tarde, muitos portugueses estabeleceram-se em Amesterdão, cuja Bolsa era a mais importante nos finais do século XVII, onde foram identificados com as práticas especulativas em mercadorias e, em especial, acções. Em escritos da época, é referido que esses portugueses dispunham de boas relações internacionais e uma grande capacidade de antecipação fruto da obtenção rápida de informações.

Mas a intervenção portuguesa na Bolsa de Amesterdão tinha sólidas bases. Para o avaliar basta dizer que ilustres emigrantes portugueses, como José da Veiga e Isaac de Pinto, escreveram obras fundamentais, atendendo à época da sua publicação, respectivamente sobre operações de bolsa sobre acções, especialmente operações a prazo, e sobre o mercado da dívida pública e a teoria das finanças. É caso para dizer: é obra!!

Não percamos pois a esperança de ver surgir no actual panorama bolsístico internacional, algum português da envergadura de um António Damásio, por exemplo, que investigue e escreva sobre a vertente psicológica dos mercados financeiros.

Voltando à Bolsa de Lisboa, após o terramoto de 1755, a sua localização passou para o Torreão do lado nascente da Praça do Comércio, de onde só saiu em1994. Salvo curtos períodos de maior movimento, o mercado sempre foi extremamente limitado e cada vez menos inovador.

A evolução posterior é, obviamente, bem conhecida de todos. Num mundo alargado pela facilidade das comunicações, os mercados financeiros são os que maior proveito tiram da globalização, e a pequena dimensão da bolsa portuguesa esbate-se nos actuais sistemas internacionais de negociação em que nos estamos a integrar.

Voltemos assim ao presente, pois há muita informação para acompanhar e operações para concretizar, que só esperam um gesto nosso, uma decisão, um clic no botão do PC.

domingo, outubro 12, 2003

Os Ministros ganham bem?

Fim de semana passado a descansar, a pôr algumas leituras em dia e a fugir com bastante sucesso das notícias dos nossos telejornais. Todos sabem ao que me refiro. O problema, claro, não são as notícias, mas o martelar infindável dos nossos “agentes” políticos de todos os partidos que, em vez de estarem calados a trabalhar ou a repousar, a bom recato, teimam em opinar e marcar posição a torto e a direito. Para, através da comunicação social, mostrar que existem. Mas que existência tão medíocre e pardacenta, palavrosa e primária!

Voltando ao fim de semana, ouvi e li algumas coisas interessantes. Em primeiro lugar, na sua crónica no DNA de sábado, Eduardo Barroso escreveu sobre o nível de vencimentos dos políticos e da impossibilidade que ele teria em aceitar qualquer eventual cargo no governo, pela exiguidade da retribuição que decerto o atiraria para a falência.

Mas antes do jantar de sábado e no meio de conversas cruzadas, veio-me ao ouvido o final do programa televisivo de José Hermano Saraiva, em que abordava a figura de Fernandes Thomaz, líder do executivo do nosso País após a revolução de 1822, que não quis receber qualquer compensação monetária pelo seu cargo, vindo a morrer … não dá mesmo para acreditar!, vindo a morrer…de fome, exactamente por não ter fortuna pessoal e não dizer a ninguém que estava sem dinheiro!

É realmente de pasmar, os mistérios que a vida tem e quais as respostas que devemos dar a perguntas que parecem simples: o que é a honra?, o que é o civismo?, de que forma se deve servir o país?

Nos tempos de hoje, não temos em Portugal pessoas que, sendo milionárias, tenham a capacidade, o desejo, ou a oportunidade de servir o País, em qualquer cargo político de topo. Não digo que fosse a solução ideal, dado que mesmo com excelente situação financeira, qualquer pessoa tem interesses particulares, económicos, sociais e políticos, que não a tornam só por esse facto mais isenta, nem melhor preparada, unicamente mais independente… financeiramente.

Então só temos duas categorias principais de pessoas para ocupar cargos públicos: os de carreira exclusivamente partidária, que nunca se destacaram em nada de especial e os (poucos) de maior craveira, que têm capacidades especiais e credibilidade pessoal a nível do país. Destes últimos, não temos ouvido, até agora, grandes queixas relativamente às remunerações para cargos governamentais.

Mas não teremos perdido muita gente de valor ao longo dos anos, e não estaremos a perder agora outros, que nem põem a hipótese de ocupar cargos públicos de topo, mesmo de forma transitória, por motivos financeiros?

O problema não tem solução a curto prazo. Quem decidiria sobre pagamentos diferenciados muito mais elevado a determinadas estrela políticas, aos “Figos” da governação? Como teria de ser sempre uma decisão casuística, com base num mero quadro legal que o permitisse, não se poderiam evitar eventuais arbitrariedades, implicando a possibilidade de arranjar gato por lebre.

Ficamos então como estamos, sem estrelas e sem grandes perspectivas, cada vez mais afastados dos políticos, esses eternos protagonistas de noticiários e manchetes.

Pobres protagonistas…

quinta-feira, outubro 09, 2003

Países à beira de um esgotamento

Com a tranquilidade que deriva da minha experiência, posso testemunhar que todos andam enganados sobre a riqueza dos Países, traduzida pelo simpático indicador conhecido pelo nome de Produto Interno Bruto ou simplesmente PIB (GDP).

Pois deixem-me que lhes diga, desde já, que eu estou deveras preocupado com os PIB´s de muitos países, mesmo da grande maioria deles, à escala do nosso planeta. E, reparem, não vou falar agora nem de valores absolutos nem de valores per capita, que até davam para uns paradoxos interessantíssimos. Vou abordar principalmente o crescimento da riqueza, ou seja, a percentagem de aumento anual do PIB.

Vejam só isto: parece que todos os países estão a crescer, a enriquecer. A China 8% ao ano, o Laos 3%, o Uruguai, 4%, a Espanha 2%, os EUA 4%, Portugal 0,01%, a Nova Zelândia 5%, os Camarões 3,5%. Mas, alguém acredita nisto? Quando há um País mais aflito, com “crescimento negativo”, a coisa é passageira, rapidamente volta ao normal e ás subidas anuais do PIB.

É um verdadeiro mistério. Sim, porque a economia tem aspectos insondáveis, em que até é preciso um pouco de coragem para meter o nariz. Olhamos para a África, pobre, delapidada, emigrada, e o que é que nos dizem as estatísticas? Adivinharam! O crescimento do PIB é positivo, com uma média muito redonda de 3 a 4% (!), acrescentando esses dados que será ainda necessário um maior aumento (!!) para que se diminua o atraso relativo desse continente (!!!).

E isto é só mais um exemplo que vale, com as devidas proporções, para todos os países e continentes com atrasos relativos no seu de crescimento. Claro que eu passo por cima do Iraque, Afeganistão, Yémen, Somália, Venezuela e outros, que ficam de fora destes comentários por uma simples questão de bom senso.

Ás vezes parece-me que alguma coisa me escapa neste permanente crescimento à escala mundial. Eu bem me ponho a pensar humildemente em que cada vez há mais reformados, maior número de jovens sem emprego e multidões de desempregados, muitos deles que há muito desistiram de arranjar trabalho. Por outro lado, nos países mais desfavorecidos, as produções agrícolas, por exemplo, sofrem grandes destruições por motivos climáticos e outros e o respectivo reflexo nas estatísticas não se descortina. Mas dizem-me que, no primeiro caso, os trabalhadores que restam no activo têm uma enorme produtividade e que, no segundo caso, os apoios internacionais compensam esses outros países mais atrasados, equilibrando-os minimamente. Estes argumentos são extremamente interessantes, não acham?

Mas há aqui uma ilusão qualquer, uma grande falácia inter-continental! Já repararam que se uns não trabalham por que não podem, outros porque não querem, ainda outros porque não precisam, como é que a riqueza nasce? São as fabricas a trabalhar em piloto automático, são as máquinas a substituir cada vez mais o homem? São as industrias tecnológicas e de inovação que marcam a diferença? Ah, então se é isso está explicado, não é? Mas, por exemplo, na Ásia toda é assim?

Estamos nitidamente a tender para uma sociedade em que uma pequena minoria tem que trabalhar para que a grande maioria faça ou o que bem lhe apeteça, no género “ agora é que vou ter tempo para ler e viajar” ou, pelo contrário, não faça nada, com um lamento de “e agora o que é que eu vou fazer, aos 39 anos?”.

Estou para ver é quando os chineses chegarem a este nível de desenvolvimento! Já pensaram o que serão algumas poucas dezenas de milhões (uma ínfima parte da sua população total), a “ler e a viajar”? Bom, haverá alguns países (de destino turístico) em sério risco de irem literalmente ao fundo; e que dizer das edições de bolso de livros ocidentais traduzidos para o chinês? Vão fazer-se muitas fortunas, só é preciso acertar com o enredo adequado!

Mas a evolução e o crescimento dos países é uma verdadeira caixinha de surpresas. Ainda não há muitas décadas atrás havia um grupo de países (China, Brasil, Índia, Japão, Austrália, Canadá) considerados como grandes potências num futuro que se pensava anterior ainda ao ano 2000. Está-se a ver o que aconteceu: exceptuando a China, que terá fôlego para isso daqui a várias décadas, os outros lá se vão aguentando, uma vezes melhor outras vezes pior, mas com os mais evoluídos a dispensarem completamente esse objectivo que terá que ser repensado mais cedo ou mais tarde.

Mas, o contrário já aconteceu com uma rapidez incrível. A União Soviética evaporou-se como o vodka, da noite para o dia, e a Rússia passou a desempenhar o papel de parente muito pobre do G-7.

E o que dizer dos Estados Unidos da América, a única superpotência em exercício, a terra dos Kennedy´s e da Marilyn, do clã Sinatra e da Ella Fitzgerald, de Estados tão diferentes como o Utah e a Califórnia, do basebol e do golfe, do futuro e dos futures and options. Pois esses EUA, têm mesmo de tomar cuidado, os problemas às vezes estão mesmo ao voltar da esquina, aparecem de repente e deixam estragos por muito tempo. Gastar muito mais do que se tem, anos e anos a fio, é demasiado arriscado mesmo para uma superpotência. Mas isto somos nós a falar, claro!?

A propósito, o mês passado fui à Dinamarca e é bem visível para toda a gente, que a qualidade de vida deles está centrada mais nas pessoas do que no país. Não querem ter bombas atómicas (que alguns países pobres teimam em obter), nem pretendem efectuar viagens à lua ou ao sistema solar (que continua a ser uma atracção dos que se julgam grandes). Países como a Dinamarca (e a Noruega e a Suécia), só pretendem continuar a ter um dos mais altos níveis de vida do mundo, sem apresentarem qualquer franja de verdadeira pobreza.

Mas enfim, voltar para casa é sempre agradável, neste Portugal em que todos os políticos agora dizem que as instituições funcionam. Se isso é verdade então eu devo ser o Bill Gates disfarçado de Comentador. Neste país que tem gestores de topo que não sabem o que é uma cobertura do risco de câmbio e que julgam que o yield é o nome de um desporto radical, desfrutamos o privilégio de observar tudo o que não funciona com um sorriso nos lábios, com aquela serena esperteza ou o amável desprezo de sabermos bem o que a casa gasta.

quinta-feira, outubro 02, 2003

Uma Teoria Estonteante

Como sabem, sou uma pessoa prática. Para mim, as teorias mais complexas e devastadoras devem ser apresentadas de forma simples, clara e aberta. O cenário que vou apresentar a seguir, embora pouco ortodoxo, tem subjacente as técnicas mais adequadas e o bom senso mais elementar. Por isso mesmo, para além de tomarem as devidas precauções, podem levar este tom coloquial à letra e, no final, para conversarmos um pouco, se assim o entenderem.

Ah! E não se admirem de ir contra o que eu próprio escrevi na crónica anterior (…”importante não é de forma nenhuma tentar saber ou descobrir o que vai acontecer no futuro”)! É que há casos em que devemos abrir uma excepção, e avançar com as nossas opiniões, as quais embora sendo meras hipóteses, podem fazer-nos pensar, o que já é uma boa desculpa.

Comecemos, então. Olhando para o USD, cuja evolução irá influenciar grandemente as bolsas em todo o mundo, vamos observar uma situação muito curiosa: a moeda norte-americana passou a ser, após 1944 (ano da criação do sistema de Bretton Woods), a mais utilizada nas transacções internacionais e a mais importante a nível mundial mas, ao mesmo tempo, não tem parado de se desvalorizar progressivamente. Com efeito, analisando as últimas décadas, o US Dollar Index (DX) tem sofrido inúmeras fortes variações, a mais importante das quais foi a descida de 164,7 em 25-02-85 para 78,3 em 09-01-92 (menos 53%),

Em relação ao Marco (DM/$) e ao iene (USD/JPY), de 1970 até 1995, a desvalorização do USD foi de 62% e 72%, respectivamente. De destacar, o período de pouco mais de 2 anos e meio, entre 1985 e finais de 1987, em que houve uma descida do USD de 54%, tanto em relação ao marco como em relação ao iene.

E o USD passou por isto tudo para poder continuar a desempenhar o seu papel de protagonista na cena mundial, caindo muitas vezes e depois levantando-se cada vez mais trôpego e curvado. Dá que pensar!

Só que estamos na altura de, no âmbito da sua actual tendência descendente de médio/longo prazo, perspectivarmos um provável reforço da duração e do nível da correspondente descida, tentando “ver”, no denso nevoeiro, o que “tem” de acontecer, mesmo que pareça um cenário exagerado ou essa eventualidade se nos afigure irrealista.

E é precisamente nesse contexto que alguns economistas internacionais estão a ponderar qual a percentagem necessária de desvalorização do USD (contada a partir de agora!), relativamente às moedas (euro e iene) dos seus maiores parceiros comerciais. E isto para não haver uma desgraça financeira global, motivada pelo aumento crescentemente acelerado do défice das contas externas dos EUA, que já conta com vários triliões no seu saldo.

Realmente, as previsões daqueles técnicos variam, mas praticamente nenhum deles tem dúvidas de que uma descida bastante pronunciada é infalível, com a posição dos optimistas a apontar para cerca de 15-20% de descida do USD, contra os 50% de desvalorização que os mais pessimistas admitem. Claro que esta variação deveria ser o mais lenta possível (dois anos, no mínimo) senão o castelo de cartas poderia cair e o problema tornar-se ainda maior.

Ora, fazendo as contas, o que é que isto dá? Com uma descida intermédia do USD de 30%, relativamente ao euro e ao iene, e considerando por simplificação uma desvalorização de 10% em relação às restantes moedas do cabaz, chegam-se aos seguintes valores: o DX passaria para 71, o EUR/USD para 1,64 e o USD/JPY para 78.

Seriam estes os objectivos a atingir… prevendo um processo controlado e não linear, até para não haver rupturas ou recessão a nível mundial! Se ficaram sem palavras, sempre vos posso dizer que a realidade ultrapassa muitas vezes a ficção, e que economistas do Goldman Sachs e do Deutsche Bank estão entre os que pensam que uma desvalorização do USD entre 40-50% é a mais indicada para reduzir o défice externo dos EUA … para 3,5% do PIB, lá para 2007!!!

O Jim Sinclair apresentou há tempos uma análise do DX, em que, com a quebra do neckline do H&S gigante, ele calculava um target de 72 para esse índice. É simples e brutal. Penso que nem ele acreditava muito nisso, nessa altura. E eu também posso ainda não acreditar o suficiente nesta teoria, embora a ache cada vez mais verosímil, e aquele valor perfeitamente aceitável para um destes próximos anos…

Para não me esquecer, tenho esse número (72) pregado no meu quadro de trabalho, não tanto como um objectivo futuro, mas como um referencial dos tempos complexos em que poderemos estar todos envolvidos.

Eu posso não acreditar muito, mas que existe uma boa probabilidade, lá isso existe…

segunda-feira, setembro 22, 2003

Nível de vida (3)

Baixos salários ainda são importantes


Devido a diversas situações de fecho de empresas, pus-me a pensar na actual situação dos nossos sectores de têxteis e de calçado. As dificuldades na produtividade, no avanço tecnológico e nas economias de escala, são três factores, para além de outros, que tornam problemática a sua modernização. No entanto, a concorrência dos países asiáticos, baseada em salários baixíssimos, é o factor mais negativo de todos.

Com este panorama, na Europa, as empresas de maior dimensão estão a deslocalizar-se ou em vias de o fazer, para países como Marrocos, Roménia e Bulgária, sempre à procura de baixos salários.

Neste ponto, é muito interessante relembrar uma das grandes expectativas de grandes economistas, no campo da competitividade, os quais, nas décadas de 80 e 90 (e mesmo antes), acreditavam nas seguintes tendências: (1) gradual diminuição da diferença de salários entre os países desenvolvidos e em vias de desenvolvimento; (2) redução muito sensível do peso do factor mão-de-obra nos custos de produção pela via do esperado grande aumento do investimento tecnológico; (3) os países de baixos salários do Extremo Oriente, deixariam de ser uma ameaça competitiva, tendo que se preocupar com a qualidade, design, etc.

Como o engano foi grande! Não só nos têxteis, mas na generalidade dos sectores, os custos de pessoal são o factor decisivo, mesmo quando estão em causa trabalhadores muito qualificados (como é o caso da Índia no suporte informático a grandes empresas dos EUA).

terça-feira, setembro 16, 2003

Milhões!...

Ao voltar de férias, estou a actualizar as notícias e informações sobre os mercados, seleccionando as que, na minha opinião, merecem mais atenção. Parece, eu digo parece, que a eterna luta Bulls vs Bear está a ser ganha de forma cada vez mais clara pelos primeiros, independentemente de se manterem os biliões de dólares de dívida da grande maioria das big caps mundiais e dos triliões de défice comercial dos E.U.A, aliás sempre em crescimento acelerado.

Não há dúvida que estamos numa época em que notícias de biliões e triliões nos passam pelos olhos (através do monitor do PC, bem entendido!), a uma velocidade diabólica, e já ninguém liga a isso…

Também parece que a retoma começa a despontar no horizonte, isto se a neblina matinal não me estiver a enganar. Se for mesmo verdade, pode vir com uma força inesperada, fazendo com que todas as bolhas sejam reactivadas e fiquem cada vez mais redondas. Será que estamos só a meio da subida?

Mas no meio dos “montes” de informação, também me passou pelos olhos uma pequena história sobre o nosso conhecido Dick Grasso, personagem simpática para todo e qualquer visitante VIP da New York Stock Exchange, de que é o respectivo Chairman.

Pois o Sr. Grasso “levou para casa” recentemente, em remunerações especiais e incentivos, a engraçada quantia de 140 milhões de dólares (130 milhões de euros ou 26 milhões de contos, desculpem lá, para ainda melhor percepção). Logo por azar, o Presidente da SEC, instituição que é uma espécie de Inspecção-geral dos Mercados nos EUA, quer saber ao tostão como é que foi calculado aquele valor. Veremos no que dá!

Triliões, bolhas, retoma, Grasso, dólar, EDP, Outubro… fico a pensar nisto tudo e em muitas outras coisas, esforçando-me por relacionar os dados, tentando chegar perto da chave deste enorme puzzle.

Continuo a pensar e pasmo: 3 ou 4 triliões de défice comercial acumulado dos states e o mercado até dá um prémio subindo como sobe; centenas de biliões de dívidas de enormes empresas que esperarão outra oportunidade para limpar o passivo; muitos milhões de dólares para CEO´s à moda yankee, os quais têm como maior objectivo bater as estimativas definidas por eles próprios. Enfim, seja o que for que o futuro nos reserve, a situação está longe de ser brilhante!

sábado, setembro 13, 2003

Nível de vida (2)

Um pôr-do-sol avermelhado já não é o que era


Um jantar à beira-mar, a dois, olhando o sol a desaparecer no horizonte, que logo se torna vermelho prenunciando uma noite esplêndida, é realmente uma coisa boa. No entanto, embora estivéssemos na esplanada, havia uma televisão ao longe, lá bem dentro do restaurante, que não nos deixava esquecer dos incêndios, esta nova desgraça portuguesa.

Como é possível, ano após ano, mês após mês, incêndio após incêndio, andarmos sempre nesta desorganização crassa, nesta falta de comando a todos os níveis, nesta imprevidência gritante que é a falta de prevenção, de cuidado e de civismo? O que é que ainda teremos de passar para mudarmos, para nos modernizarmos, nos educarmos, para deixarmos de pensar a todos os níveis, “logo se vê”, “para o ano logo se vê”!?

Por favor, neste caso, mais inquéritos e apuramento de responsabilidades, não! Devemos ser nós, seguramente devemos ser todos nós a assumir a responsabilidade, e eu espero que quem nos representa, e faz a gestão do nosso País, salte para cima de uma mesa e fale bem forte o que deve ser feito, quem deve fazer o quê e quem deve deixar de fazer seja o que for!

Em termos de nível de vida, por aqui, estamos completamente conversados!!
Ponto de Situação

1. Nível de vida” - vou continuar, numa base desejavelmente diária, a escrever sobre assuntos directa ou indirectamente ligados a este tema.

2. EUR/USD – este cross, que acompanho há anos, é um verdadeiro reflexo das forças financeiras mundiais em combate incessante. Sim, não tenham dúvidas, é aqui que tudo se decide, já que o USD e o Euro são, de longe, as duas moedas mais importantes do planeta (por aquela ordem…). Também vou, regularmente, continuar a referir as fases mais interessantes desta verdadeira guerra.

quinta-feira, setembro 11, 2003

Nível de vida

É uma noção fundamental nos dias que vão correndo. Para ser possível concluir se ganhamos bem ou mal, se os produtos e serviços que adquirimos são mais ou menos caros, se a casa em que vivemos, seja própria ou alugada, tem ou não um custo ou uma renda a roçar o impossível, se os nossos horizontes são a perder de vista ou curtos em demasia.

Devemos estar conscientes que factores decisivos vão implicar a existência de diferentes necessidades, a serem satisfeitas por cada um de nós. Assim, a idade, o estado civil, o número de filhos, o local onde se vive, o nível de instrução, a profissão, os gostos e as expectativas pessoais e tantas outras coisas, tornam a qualidade de vida quase um assunto pessoal, às vezes bem guardado dentro de cada família.

No entanto, abstraindo dos inúmeros casos particulares, vou dar ênfase a aspectos chave da vida corrente, para conseguir ver mais claro no que respeita à verdadeira situação em que nos encontramos. Depois podemos comparar o nosso nível de desenvolvimento como País, com o de outros, como os União Europeia alargada e não só.

Tenciono somente dar umas pinceladas sobre este assunto, apresentando diversos tipos de comentários, que nada terão a ver, no entanto, com um verdadeiro estudo sobre a matéria. Na minha opinião, este assunto é tão interessante que permitirá tocar noutros temas com ele relacionados, como complemento ou extensão informal.

É isto que vos proponho para os próximos tempos. Em cada dia, abordarei um aspecto da questão, com o objectivo de chegar a conclusões e, fundamentalmente, vou escrever em voz alta, como quem espera ser ouvido.

quarta-feira, setembro 10, 2003

Luta sem tréguas

Espero que tenham gostado da minha primeira crónica nesta página. É minha intenção fazer aqui um breve comentário quase diário e um artigo mais extenso talvez uma ou duas vezes por semana. Como já viram, os temas andarão sempre à volta dos mercados financeiros, e de situações ligadas à economia e às finanças, escritos num tom propositadamente leve, umas vezes mais irónico e sorridente, outras vezes um pouco mais sério.

Está bastante renhida a luta entre o euro e o USD. Estamos na fase em que todos os Países (e por maioria de razão, a União Europeia) tentam ver desvalorizadas as respectivas moedas, por motivos de competitividade comercial. Para isso intervêm fortemente no Forex, uma vezes com mais sucesso do que outras. É por esta razão principal que o USD pôde abrandar a descida que vem fazendo desde princípios de 2002.

Comentador

terça-feira, setembro 09, 2003

O Especulador Feliz

Estou entusiasmado com o meu trading! Que vida tão interessante que arranjei!!

Depois de perceber que o Chairman do Fed, Alan Greenspan, está a cuidar da nossa vida, este bullmarket não me escapa mesmo. Não há perigo de deflação, estamos naquele célebre 2º. Semestre, em que os corporate earnings vão subir e há-de haver gastos de consumo e de investimento a torto e a direito. Não pode falhar!

A minha disposição é imparável, dando uma vista de olhos aos yields, compro bonds na Europa, treasuries nos States, equities em todo o lado. Orgulho-me de não ter qualquer receio de bolhas, pois se é para subir contem comigo!

Poderão perguntar-me se as valuations não estarão exageradas? E eu respondo: meus caros amigos, num mercado que está a subir, o que interessa são os inflows e o momentum, nada mais. E não se deixem dominar pelo medo, mas por favor tenham alguma ganância. Ou vice-versa, que também serve.

E eu ainda por cima diversifico esplendidamente. Por exemplo, também estou nas currencies, nos crosses mais importantes. O EUR/USD então enche-me as medidas, posso estar bull umas vezes no euro outras no dólar, a volatilidade é tanta que as tendências fortes não são beliscadas por profundas correcções. Só não gosto é de lateralizações com um range muito estreito. Já se for uma boa consolidação, isso é sempre bem vindo, pois a seguir é andar para a frente a todo o gás.

E o ouro, prata e afins? Há quem diga que se trata da quimera do ouro e da ilusão permanente da prata? Estão enganados!! Isso é não conhecer os fundamentais da economia e os valores permanentes a que nos podemos agarrar. Portanto, o bullion, os metais preciosos em barra, será um remédio para os dias menos bons, ou até para ter alguma base seja o que for que aconteça.

Outra coisa que aprendi é a ter flexibilidade. No caso de uma enxaqueca do Sr. Greenspan, meto logo a agulha para os curtos, mas tem de ser uma coisa a valer, do género breakdown com bastante volume. Mesmo aí ninguém me agarra, pois estou sempre atento aos contrarian indicators e às negative divergences. É que nisto dos mercados financeiros, temos de deitar mão a todos os instrumentos.

Mas, em contrapartida, há commodities que constituem grandes oportunidades. Por exemplo, nos futuros e opções de crude oil, copper, cattle, sugar, grains, e o mais envolvente de todos, cocoa, é tudo óptimo: não é preciso perceber nada destes sectores económicos, basta entrar nas alturas certas e ler bem os gráficos que o dinheiro entra às carradas!! Eheheh … Fácil, não é?

No meio desta valente artilharia que eu, sem dó nem piedade, disparo em todas as direcções, há por vezes (e a situação é completamente excepcional) alguns cuidados a ter. Por exemplo, os soybeans e o coffee são verdadeiramente demoníacos. Sabe-se exactamente qual é o padrão técnico das suas cotações ao longo do ano. Pois mesmo assim, só traders profissionais especializados conseguem ganhar dinheiro aqui. É realmente um mistério que, rapidamente, vou ter que desvendar.

E não me levem a mal, não pensem que é a vaidade que me faz falar. Pelo contrário, estou a contar aspectos que decerto interessam a toda a gente, aproveitando para me livrar do stress acumulado, pois estou em operações financeiras globais de alto nível, mesmo de cortar a respiração.

Tenho, é certo, por vezes alguns momentos de cansaço. É nessas alturas que, para descontrair, invisto em derivativos especiais. Deste modo, para relaxar mesmo, nada melhor do que um bom ratio option spread, que assim o tempo não custa a passar, é como beber um shake de rum, cola e canela, numa praia escondida das Pequenas Antilhas.

E não julguem que eu só falo de mercados estrangeiros. Não senhor! Por exemplo, a EDP não me escapou e acho que ainda me vai dar mais alegrias. Estas utilities são deliciosas! Já com os bancos, é preciso estar sempre de pé atrás. Até o BPI se lembrou de quebrar o suporte depois de uma vigorosa trend ascendente de largos meses. Lá tive de fazer um profit taking, o que é que se há-de fazer. Por outro lado, tenho warrants de todas as qualidades e feitios, alguns completamente out-of-the-money e com deltas insignificantes. Penso que, para estes últimos, a culpa só pode ser do market maker!

E assim vou continuar completamente dedicado ao trading, sempre picking the best e mantendo a necessária downside protection. Não há nada melhor do que, dominando o Big Picture, fazer um bom position trading com o indispensável money management.

Comentador


Nota importante

Este texto não pretende reflectir a opinião do seu autor. Tem como objectivo tentar explicar um pouco a realidade sob a luz da simples ironia. Por outro lado, qualquer operação que um leitor desprevenido decida ensaiar, com base nas observações acima expressas, não o tornará certamente famoso, antes o deverá levar directamente à falência.